O amor

O amor, como comumente se entende na terra, é um sentimento, um impulso do ser que o leva para outro ser com o desejo de unir-se a ele. Mas, na realidade, o amor reveste formas infinitas, desde as mais vulgares até as mais sublimes. Princípio da vida universal, proporciona à alma, em suas manifestações mais elevadas e puras, a intensidade de radiação que aquece e vivifica tudo em torno de si; é por ele que o espírito se sente estreitamente ligado ao Poder Criador.

Acima de tudo, Deus é amor. Por amor, criou os seres para associa-los à sua alegria, a sua obra. Os homens receberam o princípio afetivo para ser destinado a germinar e expandir-se pela provação dos séculos, até que tenham aprendido a dar-se por sua vez, isto é, a dedicar-se, sacrificar-se pelos outros. Com este sacrifício, em vez de se amesquinharem, mais se engrandecem, enobrecem e aproximam de Deus.

O amor é uma força inexaurível, renova-se sem cessar e enriquece ao mesmo tempo aquele que dá e aquele que recebe. É pelo amor, que Deus mais eficazmente atua no mundo, Por ele, atrai para Si todos os pobres seres retardados nos antros da paixão, os espíritos cativos na matéria; eleva-os e arrasta-os na espiral da ascensão infinita para os esplendores da luz e da liberdade.

O amor conjugal, o amor materno, o amor filial ou fraterno, o amor da pátria, da raça, da humanidade, são refrações, raios refratados do amor divino que abrange, penetra todos os seres, e, difundindo-se neles, faz rebentar e desabrochar mil formas variadas de florescência do amor...

Até às profundidades do abismo de vida, infiltram-se as radiações do amor divino e vão acender nos seres rudimentares, pela afeição à companheira(o) e aos filhos, a primeira claridade que , nesse meio de egoísmo feroz, serão como a aurora indecisa e a promessa de uma vida mais elevada. É o apelo do ser , é o amor que provocará, no fundo das almas embrionárias, os primeiros rebentos do altruísmo, da piedade, da bondade. Mais acima, na escala evolutiva, entreverá o ser humano, nas primeiras felicidades, nas únicas sensações de ventura perfeita que lhes é dado gozar na terra, sensações mais fortes e suaves que todas as alegrias físicas e conhecidas somente das almas que sabem verdadeiramente amar.

Assim, de grau em grau, sob a influência e irradiação do amor, a alma desenvolver-se-á e engrandecerá, verá alargar-se o circulo de suas sensações. Lentamente, o que nela não era senão paixão, desejo carnal, irá se depurando, transformando num sentimento nobre e desinteressado; a afeição a um só ou a alguns converter-se-á na afeição a todos, à família, à pátria, à humanidade etc.

A alma adquirirá a plenitude de seu desenvolvimento quando for capaz de compreender a vida espiritual e a participar dela...

O amor é mais forte do que o ódio, mais poderoso do que a "morte". Se Jesus foi o maior dos missionários e dos profetas, se teve e tem influência sobre os homens, foi porque trazia em si um reflexo mais poderoso do Amor Divino. Não foi pela ciência nem pela arte oratória que ele seduziu e cativou a multidão; foi pelo amor ! Desde o seu desencarne, seu amor ficou no mundo como um foco sempre vivo, sempre ardente. Por isso, apesar do erros e faltas de seus representantes, apesar de tanto sangue derramado por eles, de tantas fogueiras acessas, de tantos véus estendidos sobre seu ensino, o Cristianismo continuou a ser a maior das religiões; disciplinou, moldou a alma humana, amansou a índole feroz dos bárbaros, arrancou raças inteiras à sensualidade ou a bestialidade...

Jesus não é o único exemplar a apresentar. Pode-se de modo geral, verificar que das almas eminentes se desprendem radiações, eflúvios regeneradores, que constituem uma como atmosfera de paz, uma espécie de proteção, de providência particular. Todos aqueles que vivem sob esta benéfica influência moral sentem uma calma, um sossego de espírito, uma espécie de serenidade que dá um antegozo das quietações celestes. Esta sensação é mais pronunciada ainda nas sessões espíritas dirigidas e inspiradas por almas superiores...

Por isto também se explicam e se afirmam a solidariedade e fraternidade universal. Um dia, quando a verdadeira noção do ser desembaraçar das dúvidas e incertezas que obsidiam o pensamento humano, compreenderemos a grande fraternidade que une os espíritos. As almas constituem os agrupamentos separados; famílias que se foram pouco a pouco formando através dos séculos, pela comunidade das alegrias e das dores. No entanto, a verdadeira família é a do mundo espiritual; a da terra não é mais do que uma imagem daquela, redução enfraquecida, como o são as coisas deste mundo comparadas com as do plano espiritual. A verdadeira família compõe-se dos espíritos que subiram juntos as ásperas sendas do destino e são feitas para se compreenderem e amarem.

Quem pode descrever os sentimentos ternos, íntimos, que unem esses seres, as alegrias inefáveis nascidas da fusão das inteligências e das consciências, a união das almas sob o sorriso de Deus ? Estes agrupamentos espirituais são os centros abençoados onde todas as paixões terrestres se apaziguam, onde os egoismos de desvanecem, onde os corações se dilatam, onde vem retemperar-se e consolar-se todos aqueles que tem sofrido, quando, livres apos o desencarne, tornam a juntar-se com os bem-amados, reunidos para festejarem seu regresso...

Com estas festas do amor, os espíritos que aprenderam a tornar-se livres e a usar de sua liberdade fundem-se num mesmo fluido, a vista comovida de seus irmãos. Daí em diante seguirão uns aos outros em suas peregrinações através dos mundos; caminharão de mãos dadas e haurindo na ternura comum a força para suportar todos os reveses, todas as amarguras da sorte. Algumas vezes separados pelos renascimentos, conservarão a intuição secreta de que seu insulamento é apenas passageiro; depois das provas da separação, entrevêem a embriaguez do regresso.

Entre os que caminham neste mundo, solitários, entristecidos, curvados sob o fardo da vida, há os que conservam no fundo do coração a vaga lembrança da sua família espiritual. Estes sofrem cruelmente da nostalgia dos espaços e do amor celeste, e nada entre as alegrias da terra os pode distrair e consolar. Seu pensamento vai muitas vezes, durante a vigília, e, mais ainda, durante o sono, reunir-se aos seres queridos que os esperam na paz serena do alem. O sentimento profundo das compensações que os aguardam explica sua força moral na luta e sua aspiração para o mundo melhor. A esperança semeia de flores austeras os atalhos que eles percorrem...

É preciso amar, porque, sem o amor, a vontade e a ciência seriam incompletas e muitas vezes estéreis. O amor ilumina-as, fecunda-as, centuplica-lhes os recursos. Não se trata aqui do amor que contempla sem agir, mas do que se aplica a espalhar o bem e a verdade pelo mundo. A vida terrestre é um conflito entre as forças do mal e as do bem. O dever de todo espírito viril é tomar parte no combate, trazer-lhe todos os seus impulsos, todos os seus meios de ação, lutar pelos outros, por todos aqueles que se agitam ainda na via escura.

O uso mais nobre que se pode fazer das faculdades é trabalhar por engrandecer, desenvolver, no sentido do belo e do bem, a civilização, a sociedade humana, que tem as suas chagas e fealdades, sem dúvida, mas que é rica de esperanças e magníficas promessas; essas promessas transformar-se-ão em realidade viva no dia em que a humanidade tiver aprendido a comungar, pelo pensamento e pelo coração, com o foco do amor, que é o esplendor de Deus.

Amemos, pois, com todo o poder do nosso coração; amemos até ao sacrifício, assim como os vários mártires da humanidade, assim como Jesus amou, e então todos aqueles que nos rodeiam receberão nossa influência, sentir-se-ão nascer para uma nova vida. Procure em volta de ti as chagas a pensar, os males a curar, as aflições a consolar; guia os corações transviados, associa as forças, trabalha para ser edificada a alta cidade de Deus ! Ilumina, levanta, purifica ! Que importa que se riem de ti ! Que importa que a ingratidão e a maldade se levantem na tua frente ! Aquele que ama não recua por tão pouca coisa; ainda que colha espinhos, continua a tua obra, porque esse é dever, sabe que a abnegação o engrandece...

O próprio sacrifício também tem suas alegrias; feito com amor, transforma as lágrimas em sorrisos, faz nascer em nós alegrias desconhecidas do egoísta e do mau. Para aquele que sabe amar, as coisas mais vulgares são de interesse; tudo parece iluminar-se; mil sensações novas despertam nele.

São necessários à sabedoria e à ciência longos esforços, lenta e penosa ascensão para conduzir-nos às altas regiões do pensamento, no entanto, o amor e o sacrifício lá chegam de um só pulo, com um único bater de asas. Na sua impulsão conquistam a paciência, a coragem, a benevolência, todas as virtudes fortes e suaves. O amor depura a inteligência, põe a larga o coração e é pela soma de amor acumulada em nós que podemos avaliar o caminho que temos andado para Deus.

A todas as interrogações do homem, a suas hesitações, a seus temores, a suas blasfêmias, uma voz grande, poderosa e misteriosa responde: Aprende a amar! O amor é o resumo, o fim de tudo. Dessa maneira, estende-se e desdobra-se sem cessar sobre o universo a imensa rede do amor tecida de luz de ouro. Amar é o segredo da felicidade. Com uma só palavra o amor resolve todos os problemas, dissipa todas as obscuridades. O amor salvará o mundo, seu calor fará derreter o gelo da dúvida, do egoísmo, do ódio; enternecerá os corações mais duros, mais refratários.

Mesmo em seus magníficos derivados, o amor é sempre um esforço para a beleza. Nem sequer o amor sexual, o do homem e da mulher, deixa, por material que pareça, de poder aureolar-se de ideal e poesia, de perder todo o caráter vulgar, se, de mistura com ele, houver um sentimento de estética e um pensamento superior. E isto depende principalmente da mulher. Aquela que ama, sente e vê coisas que o homem não pode conhecer, possui em seu coração inexauríveis reservas de amor, uma espécie de intuição que pode dar idéia do Amor Eterno...

A mulher é sempre, de qualquer modo, irmã do mistério e a parte de seu ser que toca o infinito parece ter mais extensão do que em nós. Quando o homem responde como a mulher aos apelos do invisível, quando seu amor é isento de todo desejo brutal, então , no abraço desses dois seres que se penetram, se completam para transmitir a vida, passará como um relâmpago, como uma chama, o reflexo de mais alta felicidades entrevistas. São todavia, passageiras e misturadas de amarguras as alegrias do amor terrestre; não andam desacompanhadas de decepções, retrocessos e quedas. Somente Deus é o amor na sua plenitude; é o braseiro ardente e, ao mesmo tempo o abismo de pensamento e luz, donde dimanam e para que ascendem eternamente os quentes eflúvios de todos os astros, as ternuras apaixonadas de todos os corações de mulheres, de mães, de esposas, de afeições viris de todos os corações de homens. Deus gera e chama o amor, porque é a Beleza infinita, perfeita.

Abri o vosso ser interno, abri as janelas da prisão da alma aos eflúvios da vida universal e, de súbito essa prisão encher-se-á de claridades, de melodias; um mundo todo de luz penetrará em vós. Vossa alma arrebatada conhecerá êxtases, felicidades que não se podem descrever; compreenderá que há em seu derredor um oceano de amor, de força e de vida divina no qual ela está imersa e que lhe basta querer para ser banhada por suas águas regeneradoras...

"Se o amor não divide, a felicidade não multiplica".

Desejo saúde e muita paz à todos.

 

Oliver

 

Fontes (No mundo maior, André Luiz; O problema do ser do destino e da dor, Léon Denis)

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